domingo, 27 de fevereiro de 2011

Da Teoria da Forma aos elementos básicos da comunicação visual


A teoria da forma (Gestalt), aplicada à percepção visual, tenta explicar a forma estruturada como percebemos a realidade que nos rodeia. Primeiramente aplicada na prática por Max Wertheimer, Wolfgang Köhler e Kurt Koffka, estes definiram os princípios pelos quais esta se rege, as Leis da Gestalt, são elas as seguintes:
  • Lei da Semelhança – items semelhantes tendem a ser agrupados em conjunto;
(segundo esta lei, a maioria das pessoas tende a ver colunas verticais de quadrados e 
 círculos)
  • Lei de Prägnanz – realidade é organizada da forma mais simples possível;
(segundo esta lei, vemos esta imagem como um conjunto de círculos em vez de outras formas presentem mais complexas)
  • Lei da Proximidade – objectos próximos uns dos outros tendem a ser agrupados em conjuntos;
(segundo esta lei, vemos os círculos do lado esquerdo agrupados numa coluna vertical e os do lado direito numa linha horizontal)
  • Lei da Continuidade – pontos conectados por linhas rectas ou curvas são vistos da forma mais simples;
(nesta figura, ao invés de vermos linhas e ângulos, vemos uma sequência simples de pontos que formam um caminho mais suave)
  • Lei de Clausura – objectos agrupados em conjunto, são vistos como um todo;
(nesta imagem, o tendência é para ignorar as falhas e completar a imagem, na imagem não existe nenhum triângulo nem círculos mas a nossa mente fá-lo para criar imagens e formas que nos são familiares)

  • Lei da Experiência Passada -> certas formas só são apreendidas se tivermos consciência prévia da sua existência;
(esta imagem espelha bem a forma como a nossa experiência influencia a percepção que temos da realidade que nos rodeia, a experiência com esta imagem é a de que adultos vêm uma cena íntima entre um casal mas uma criança, por seu lado, vê apenas golfinhos)
(O que é a Gestalt?)
De que forma se relaciona a Gestalt com o design de comunicação visual?
Um pouco por todo lado, por vezes até sem reparar-mos, podemos encontrar exemplos da teoria da forma aplicada à comunicação visual. A Gestalt funciona sob a ideia base de que o que nós apreendemos da realidade não são os elementos individuais que a constituem, mas o elemento que estes formam em conjunto e que que nós percebemos de acordo com vários factores, desde a forma como a nossa estrutura neurofisiológica está concebida mas também com a nossa experiência de vida e o que nós conhecemos uma vez que não é possível vermos algo de que não temos conhecimento (como argumenta a lei da experiência passada).



Partindo deste ponto de vista, facilmente encontramos exemplos de comunicação visual assente em elementos individuais manipulados de forma a, no seu conjunto, serem apreendidos pelo público de certa maneira.
Para melhor compreensão, analisemos a imagem: 
Por muito que queiramos ver a imagem como um conjunto de palavras, como se de um texto se tratasse, é impossível olhar para a imagem e não ver o rosto de James Brown, ou deixar de ter a impressão de movimento pela forma como a imagem atrás está concebida. No entanto a imagem não passa de um conjunto de palavras e espaços brancos distribuídos de tal forma que a percepção que temos é de que, realmente, é o rosto de James Brown.
(Análise na íntegra à imagem) 

A Gestalt foi a primeira teoria da percepção individual mas não é, actualmente, a única. A Feature Integration Theory surge no início da década de 1980 e, embora apoiada em certas premissas da Gestalt, separa-se desta ao concluir que a percepção que temos é a agregação de elementos distintos e que esta depende da atenção, isto é, diferentes níveis de atenção geram diferentes percepções da realidade, enquanto que a Gestalt defende a percepção como um conjunto organizado de elementos. 
(A abordagem estruturalista) 
Surge também a teoria RBC (Recognition-by-components), por Irving Biederman, que defende a existência de trinta e seis geons (partes que compõem a imagem no seu todo) que, quando agregadas entre si, podem formar um número ilimitado de objectos. Citando o próprio Irving Biederman “a modest set of generalized-cone componentes, called geons, can be derived from contrasts of five readily detectable properties of edges in a two-dimensional image: curvature, collinearity, symmetry, parallelism and cotermination”. (in “Recognition-by-Components: A Theory of Human Image Understanding”).
(Irving Biederman) 
Estas são apenas algumas das teorias que sucederam à Gestalt na tentativa de explicar a forma como percebemos a realidade que nos rodeia e que factores a influenciam.
Concluímos assim que o conteúdo visual da comunicação pressupõe um conjunto de elementos de natureza visual e ambiental. A forma como vemos e apercebemos a realidade pode ser-nos transmitida de diversas formas, podemos manipular a informação que pretendemos comunicar de forma a atingir o nosso objectivo da forma mais forte possível. Esta é a contribuição das teorias da percepção da forma no que à comunicação visual diz respeito.
A comunicação visual é o princípio elementar do design, a decomposição das formas e o seu entendimento é fundamental na criação da mensagem. No que à comunicação visual diz respeito existem, segundo Donis A. Dondis em “A sintaxe da linguagem visual”, dez elementos básicos:
1.     Ponto: o ponto é o elemento de comunicação visual mais básico; quando estes se ligam, são uma forte arma para a passagem de informação, podem indicar uma direcção, dividir a mensagem, etc.
2.     Linha: podemos considerar uma linha como um conjunto de pontos tão próximo entre si quanto possível ou até, um ponto em movimento; no entanto, ao contrário do ponto, esta não é estática. A linha serve, tal como o ponto, para indicar uma direcção, levar-nos a olhar numa direcção específica, realçar um objecto, etc.
3.     Forma: existem três formas básicas: o quadrado, o círculo e o triângulo equilátero, cada uma com as suas características específicas; a forma é a  conexão entre linhas, de forma bi ou tri-dimensional.
4.     Direcção: cada uma das formas básicas acima referidas representa a sua direcção virtual, o quadrado reprensenta a horizontal e vertical, o triângulo a diagonal e o círculo a curva.
5.     Tom: o tom (claridade ou obscuridade) é a característica que acrescenta a dimensão real à nossa mensagem, não podemos recorrer apenas da perspectiva e das linhas para criar uma ilusão da realidade.
6.     Cor: podemos dividir a cor em três dimensões (matiz, saturação e brilho); cada uma das cores possui um significado simbólico próprio que lhes é, geralmente, associado sendo dessa forma uma ferramenta muito forte na mensagem que pretende ser passada ao público.
7.     Textura: embora não seja possível reconhecer a textura através do tacto, esta característica pretende ser  um substituto para o significado daquilo que apreendemos da imagem.
8.     Escala: a escala é a característica da mensagem que nos permite aperceber o que é pequeno e o que é grande, sem esta característica não existiria ponto de comparação e seria muito complicado atingir um objectivo que se relacionasse com o tamanho.
9.     Dimensão: no mundo real, existe a dimensão, mas num formato bi-dimensional, essa característica só pode ser alcançada através da ilusão da perspectiva; esta é mais um dos elementos que confere realidade a uma mensagem visual
10.  Movimento: o movimento existe apenas implicitamente no elemento visual e, tal como a textura ou dimensão, pode ser manipulada através da manipulação dos elementos, é através desses elementos que uma imagem que na realidade é estática pode adquirir a ilusão de movimento.



            Estes elementos são o alfabeto da linguagem visual e da mesma forma que é possível comunicar através da palavras, escritas ou faladas, também é possível fazê-lo através de imagens, criadas ou fotografadas. Quando compreendemos todos os elementos básicos da comunicação visual estamos qualificados para passar uma mensagem objectiva, premeditada e com um propósito declarado.
            Este é o desafio que se lança ao informador, seja ele fotógrafo, designer, jornalista, etc.. o estudar, compreender e aplicar as teorias existentes à sua visão, à sua criação. Uma mensagem para atingir o seu objectivo não pode ser criada sem um pressuposto, sem análise, sem um processo criativo delineado e estruturado. A mensagem não está “acabada” porque o seu locutor acha que esta está bem criada, esse não é o seu trabalho, ao locutor cabe o processo quase científico de elaborar uma mensagem que, embora complexa na sua criação tal o número de condicionantes e elementos necessários a ter em conta, seja simples para que o público consiga apreendê-la no seu todo. Tal como a teoria da forma, o objectivo é conseguir que todos os elementos da informação visual se conjuguem de forma a que, na sua totalidade, o receptor instintivamente se aperceba da mensagem.

Webgrafia:

Bartel, Marvin - Composition and Design. Disponível on-line:
http://www.goshen.edu/art/ed/Compose.htm#not
Biederman, Irving - Irving Biederman Homepage. Disponível on-line:
http://geon.usc.edu/~biederman/
Cherry, Kendra - Gestalt Laws of Perceptual Organization. Disponível on-line: 
http://psychology.about.com/od/sensationandperception/ss/gestaltlaws.htm
Donis, A. Dondis - A sintaxe da linguagem visual. Disponível on-line:
http://www.icicom.up.pt/~bsg/wiki/lib/exe/fetch.php?id=design_comunicacao_visual_0910%3Adcv&cache=cache&media=design_comunicacao_visual_0910:tecnicas_comunicacao_visual.pdf
Radfahrer, Luli - Aprenda Gestalt com James Brown. Disponível on-line:
http://www.luli.com.br/2007/05/22/aprenda-gestalt-com-james-brown/
Soegaard, Mads - Gestal principles of form perception. Disponível on-line:
http://www.interaction-design.org/encyclopedia/gestalt_principles_of_form_perception.html
 Stout, JaneAnn - Design: Exploring the Elements & Principles. Disponível on-line:
http://www.extension.iastate.edu/Publications/4H634.pdf#search=%22basic%20elemns%20of%20design%22

Bibliografia:

Biederman, Irving (1987) "Recognition-by-Components: A Theory of Human Image Understanding" - State University of New York at Buffalo